Súmula 431 – É ilegal a cobrança de ICMS com base no valor da mercadoria submetido ao regime de pauta fiscal.
Referências:
CTN, arts. 2º, I, e 148.
Decreto-Lei n. 406/1968, art. 2º, I e II.
Precedentes:
REsp 1.041.216-AM (2ª T, 20.11.2008 – DJe 17.12.2008) – acórdão publicado na íntegra.
RECURSO ESPECIAL N. 1.041.216-AM (2008/0059971-0)
Relatora: Ministra Eliana Calmon
Recorrente: Estado do Amazonas
Procurador: Adriane Simões Assayag Ribeiro e outro(s)
Recorrido: Friller Brasil Alimentos Ltda
Advogado: Igson de Oliveira Andrade
EMENTA
TRIBUTÁRIO. ICMS. COBRANÇA POR MEIO DE PAUTA FISCAL. IMPOSSIBILIDADE.
- É pacífico nesta Corte o entendimento de que é inviável a cobrança do ICMS com base em pauta fiscal.
- Recurso especial não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça “A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).” Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Martins, Herman Benjamin e Mauro Campbell Marques votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Dr(a). Sandra Couto, pela parte recorrente: Estado do Amazonas
Brasília (DF), 20 de novembro de 2008 (data do julgamento).
Ministra Eliana Calmon, Relatora
RELATÓRIO
A Sra. Ministra Eliana Calmon: Trata-se de recurso especial interposto pelo Estado do Amazonas, com fundamento na alínea “a” do permissivo constitucional, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, assim ementado:
MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. PAUTA MÍNIMA DE PREÇOS.
Preliminares rejeitadas: ausência de interesse de agir, porque norma infraconstitucional não pode inviabilizar o exercício de uma ação constitucional e, ainda, porque não há comprovação de que o recurso previsto no Decreto n. 20.686/99, tem efeito suspensivo; Ausência de prova pré-constituída – inadequação da via eleita, porque a matéria é de direito e não de fatos, sendo passível de exame pela via mandamental.
No mérito, configura-se ilegal a adoção de pauta fiscal, sem a ocorrência do disposto no art. 148 do CTN.
Precedentes do STJ e STF.
Mandado de segurança concedido.
O recorrente alega violação do art. 148 do CTN. Sustenta que: a) “ao contrário do sustentado pelo impetrante, a utilização da pauta fiscal não contraria o princípio da estrita legalidade, posto que, conforme demonstrado, a Resolução GSEFAZ n. 008/2005 e as pautas fiscais dela decorrentes apenas dão efetividade ao comando normativo emanado na própria Lei Complementar n. 19/97”; b) não se pode perder de foco que estamos tratando de aplicação da pauta fi scal na hipótese de cobrança de ICMS por substituição, levando em conta as operações regularmente ocorridas no mercado como base para substituição na cobrança da exação que ocorrerá nas operações posteriores”; c) “a legislação estadual amazonense, art. 19, §§ 1º, 2º, 3º e 6º, c/c os arts. 118, § 4º, do Decreto 20.686/99, aprovado com esteio na Lei Complementar n 19/97
– CTA – prevê a hipótese de lançamento através de pauta fiscal, estabelecendo, entretanto, a possibilidade do contribuinte discordar administrativamente do valor da pauta”.
Com contra-razões subiram os autos, admitido o especial na origem.
É o relatório.
VOTO
A Sra. Ministra Eliana Calmon (Relatora): É pacífico nesta Corte o entendimento de que é inviável a cobrança do ICMS com base em pauta fiscal.
Nesse sentido já tive oportunidade de me manifestar:
RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. ICMS. LEI COMPLEMENTAR 87/96 E CONVÊNIO ICMS 132/92. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. VENDA DE VEÍCULOS. FIXAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. INCLUSÃO DO VALOR DO FRETE. LEGALIDADE.
(…) 4. A jurisprudência das Turmas de Direito Público do STJ consideram tal sistemática perfeitamente válida, ressaltando que ela não se confunde com o regime de pauta fiscal rechaçada pela jurisprudência também desta Corte.
Precedentes.
(…) 7. Recurso especial parcialmente conhecido e, no mérito, improvido. (REsp 740.900/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/10/2006, DJ 31/10/2006 p. 263)
Na mesma linha destaco os seguintes precedentes:
TRIBUTÁRIO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. PRODUTOS FARMACÊUTICOS. BASE DE CÁLCULO. PAUTA FISCAL. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
1. É inadmissível a fixação da base de cálculo de ICMS com supedâneo em pautas de preços ou valores, as chamadas pautas fiscais, as quais se baseiam em valores fixados prévia e aleatoriamente para a apuração da base de cálculo do tributo, consoante entendimento pacífico desta Corte. Precedentes: RMS n. 18.634/MT, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Turma, DJ de 20.09.2007; EDcl no RMS n. 16.810/PA, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJ de 04.06.2007; RMS n. 23.502/SE, desta Relatoria, Primeira Turma, DJ de 19.04.2007; RMS n. 19.026/MT, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ de 06.03.2006.
2. Recurso provido.
(RMS 25.605/SE, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/04/2008, DJe 21/05/2008)
TRIBUTÁRIO. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. BASE DE
CÁLCULO. PAUTA FISCAL. ILEGALIDADE.
1. Segundo orientação pacificada neste Corte, é indevida a cobrança do ICMS com base em regime de pauta fiscal. Precedentes.
2. O art. 148 do CTN somente pode ser invocado para a determinação da base de cálculo do tributo quando, certa a ocorrência do fato imponível, o valor ou preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos registrados pelo contribuinte não mereçam fé, ficando a Fazenda Pública, nesse caso, autorizada a proceder ao arbitramento mediante processo administrativo fiscal regular, assegurados o contraditório e a ampla defesa
Ao final do procedimento previsto no art. 148 do CTN, nada impede que a administração fazendária conclua pela veracidade dos documentos fiscais do contribuinte e adote os valores ali consignados como base de cálculo para a incidência do tributo. Do contrário, caso se entenda pela inidoneidade dos documentos, a autoridade fiscal irá arbitrar, com base em parâmetros fixados na legislação tributária, o valor a ser considerado para efeito de tributação.
O art. 8º da LC n. 87/96 estabelece o regime de valor agregado para a determinação da base de cálculo do ICMS no caso de substituição tributária progressiva. Na hipótese, como não há o valor real da mercadoria ou serviço, já que o fato gerador é antecipado e apenas presumido, o dispositivo em tela determina o procedimento a ser adotado, assim resumido: quando o produto possuir preço máximo de venda no varejo, fixado pela autoridade competente ou pelo fabricante, a base de cálculo do ICMS antecipado será esse preço, sem nenhum outro acréscimo (IPI, frete etc); quando o produto não for tabelado ou não possuir preço máximo de venda no varejo, a base de cálculo do ICMS
antecipado é determinada por meio de valor agregado. Sobre uma determinada base de partida, geralmente o valor da operação anterior, é aplicado um percentual de agregação, previsto na legislação tributária, para se encontrar a base de cálculo do ICMS antecipado.
4. Não há que se confundir a pauta fiscal com o arbitramento de valores previsto no art. 148 do CTN, que é modalidade de lançamento. Também não se pode confundí-la com o regime de valor agregado estabelecido no art. 8º da LC n. 87/96, que é técnica adotada para a fixação da base de cálculo do ICMS na sistemática de substituição tributária progressiva, levando em consideração dados concretos de cada caso. Já a pauta fiscal é valor fixado prévia e aleatoriamente para a apuração da base de cálculo do tributo.
5. Recurso ordinário conhecido e provido. (RMS 18.677/MT, Rel. Ministro
CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 19.04.2005, DJ 20.06.2005 p. 175)
TRIBUTÁRIO. ICMS. VENDA DE REFRIGERANTES. REGIME DE SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. APURAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO COM LASTRO EM VALORES CONSTANTES DE PAUTA FISCAL. ILEGALIDADE.
1. Mandado de Segurança impetrado contra ato do Senhor Secretário da
Fazenda do Estado do Pará, pretendendo suspender os efeitos da Portaria n. 788/SEFAZ, que estabelece a cobrança do ICMS com base em valor expresso em pauta fiscal. Inegáveis efeitos concretos do referido ato.
2. Consoante as regras do sistema tributário, interdita-se a cobrança do ICMS com base nos valores previstos em pauta fiscal, porquanto o art. 148 do Código Tributário Nacional é arguível para a fixação da base de cálculo do tributo quando, certa a ocorrência do fato gerador, o valor do bem, direito ou serviço registrado pelo contribuinte não mereça fé, restando à Fazenda, neste caso, autorizada a arbitrá-lo.
3. “Está consolidado na jurisprudência da 1ª Seção, desta Corte Superior, que é impossível, segundo as regras do ordenamento jurídico tributário, prestigiar-se a cobrança de ICMS com base no valor da mercadoria apurado em pauta fiscal. O princípio da legalidade tributária há de atuar, de modo cogente, sem qualquer distorção, no relacionamento fisco-contribuinte
Não merece guarida o argumento da agravante de que o teor do art. 148, do CTN, confere legalidade ao arbitramento da base de cálculo do ICMS, eis que, in casu, não se discutiu, em momento algum, a idoneidade dos documentos e a veracidade das declarações prestadas pelo contribuinte.
“’O art. 148, do CTN, somente pode ser invocado para estabelecimento de bases de cálculo, que levam ao cálculo do tributo devido, quando a ocorrência dos fatos geradores é comprovada, mas o valor ou preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos registrados pelo contribuinte não mereçam fé, ficando a Fazenda Pública autorizada a arbitrar o preço, dentro de processo regular. A invocação desse dispositivo somente é cabível, como magistralmente comenta Aliomar Baleeiro, quando o sujeito passivo for omisso, reticente ou mendaz em relação a valor ou preço de bens, direitos, serviços: ‘…Do mesmo modo, ao prestar informações, o terceiro, por displicência, comodismo, conluio, desejo de não desgostar o contribuinte, etc., às vezes deserta da verdade ou da exatidão.
Nesses casos, a autoridade está autorizada legitimamente a abandonar os dados da declaração, sejam do primeiro, sejam do segundo e arbitrar o valor ou preço, louvando-se em elementos idôneos de que dispuser, dentro do razoável’ (Misabel Abreu Machado Derzi, in ‘Comentários ao Código Tributário Nacional’, Ed. Forense, 3ª ed., 1998).” (AGA 477.831/MG; DJ de 31/03/2003, Relator Ministro José Delgado).
Consoante é cediço na doutrina, “conforme lição de Rubens Gomes de Souza, “a pauta fiscal substitui-se à prova, e dá como provado o que trataria de provar. Neste ponto é que surge, ou pode surgir, a diferença (a tênue diferença de que fala Pugliatti) entre a pauta fiscal como presunção e a pauta fiscal como ficção.
Assim, se a pauta fiscal diz que tal mercadoria vale 1000 e isso é sabidamente certo, ou pode ser provado certo, trata-se de presunção; ao contrário, se o que a pauta diz é sabidamente falso, é de ficção que se trata.
Revelando-se a pauta fiscal ficta em presunção absoluta, esta não se aplica ao direito tributário ‘ou, pelo menos, à determinação dos elementos definidores das obrigações por ele reguladas, entre os quais, com vimos, está a base de cálculo’”
4. Recurso ordinário provido. (RMS 16.810/PA, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/10/2006, DJ 23/11/2006 p. 213)
Com essas considerações, nego provimento ao recurso especial.
É o voto.